quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Incertas






Ao lado do marido, durante a cerimônia, a esposa esquadrinha o ombro direito do homem à cata de pontos brancos. Espanta algumas caspas com o dorso da mão, põe os óculos, e se certifica que o azul marinho do tecido é como um céu em noite sem estrela. Tira os óculos e se volta a cerimônia.
Mas ela não viu que o ombro esquerdo, esquecido, continuou todo salpicado.
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A adolescente surda entra no ônibus e puxa papo com a colega de banco. Estava agitada, mais para insatisfeita do que para alegre. Gesticula, emite alguns sons guturais, observada pelo olhar atento da interlocutora. Mas a colega de banco, ouvinte, não assimila o teor do monólogo manual. A conversa veio sem manual. Responde com um olhar compreensivo e cordato.
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Depois de dias no cativeiro, a atriz famosa é resgatada. Sai nos braços do policial. Está exausta e suja. No estrito cumprimento do dever, o policial sente o cheiro da falta de higiene forçada que nem mesmo o marido famoso da atriz famosa havia sentido. O auge da intimidade.

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